há sábados em que o tempo estica muito mais do que noutro dia qualquer. e, nesses sábados, parece que as vinte e quatro horas dão para fazer muito mais coisas. sábados preguiçosos que passam ligeiros. sábados que nos deixam acordar antes de tocar o despertador mesmo que insistamos em ligá-lo em dias em que não precisamos dele. sábados tardios, sábados bons, com tempo, que nos deixam tomar banho com tempo e passar creme pelo corpo como nunca fazemos durante a semana. sábados que permitem mastigar o almoço devagar, lavar os dentes com tempo, sair de casa antecipados e ainda parar num café e dar uma vista de olhos no jornal do dia que, por acaso, não encontramos, sem medo de chegar tarde ao curso de escrita. que nos dão tempo para parar na plaza de mayo e fotografar os pintores que nunca lá estão mas que no dia em que começa a primavera por lá andam a pintar, mesmo virados de costas para o objecto pintado. sábados saborosos de fazer tempo, que nos deixam entrar vagarosamente no metro, que nos permitem descer as escadas rolantes parados, à espera de chegar, sem pressa de não perder o metro porque a seguir vem outro e temos tempo. sábados demorados, sábados de primavera ainda com chuva que dão a liberdade de duvidar se saímos ou nos deixamos ficar, se vamos ou nos deixamos dormir a sesta. sábados em que nunca sentimos que andamos a correr, sábados tranquilos que não nos deixam mentir. sábados de caminhadas e de táxis, sábados de jantares bizarros entre uma rock-star transexual rodeada de miúdos e de graúdos com mais de sessenta anos num restaurante tradicional porteño com direito a quadros de pólo e cartazes que apelam à crença na igreja evangélica. sábados que nos levam depois a um bar onde só há gente de cá, com sotaque, com aniversários e com um não redondo quando, numa tentativa inglória, alguém pergunta se há martini. não, cá não há martini, boludos. e depois, estes sábados que nos deixam, mesmo fazendo isto tudo e outras coisas que não vale a pena detalhar, chegar cedo a casa para acordar a horas decentes no dia seguinte. e demorar no despertar, como se fosse sábado bom outra vez. este foi o número 21, aqui.
Sem comentários:
Enviar um comentário