segunda-feira, 14 de abril de 2014

Atlântico - Pacífico em dez dias #2

Chegar a Uyuni



O jipe está carregado. No tejadilho, seguras por um enorme plástico cor de laranja e vários cabos, vão as nossas mochilas, uma botija de gás e a bagagem do Pedro e da Susana (o motorista e guia e a cozinheira que o acompanha). Na mala do carro, copos, pratos e talheres e a comida para esse dia e o dia seguinte. Ao nosso lado, três garrafas de vinho e uma de tequilla metidas num saco preto e compradas segundo recomendação do Freddie na loja da mãe do próprio. Sentadas no jipe, perguntam-nos se temos preferência na banda sonora. Dizemos que não. E essa é a primeira má decisão de toda a viagem. 
Depois de partimos ainda passamos por casa do Pedro para ir buscar ovos e alguns legumes frescos. É a mulher do Pedro que constrói e cozinha os menus que depois a Susana termina. O percurso inclui umas seis horas de caminho com paisagem de montanhas coloridas até chegarmos a Uyuni, onde vamos dormir, e depois a visita ao Salar onde almoçamos. O percurso acaba aí mesmo na cidade, para depois seguirmos viagem para norte. No caminho, vamos vendo o dia avançando pela cor do céu mas é o vermelho, o branco, o ocre e até o azul claro das montanhas que mais me fascina em todo o percurso. A paisagem, ora seca e árida colorida com cores de cacto, ora azul do céu e verde na terra, vai arrancando suspiros, intercalados com outros de quem já não vai suportando ouvir mais cumbia e regaeton. Os ouvidos educam-se e buenos aires, neste aspecto, já me deu um avanço catita. Mas para elas, coabitar com a batida caribenha é mais difícil. E, enquanto eu vou cantando um "mentiroso, corazon mentiroso" de mansinho, elas suspiram alto como quem já não aguenta nem mais um acorde. 
E é entre paisagens de lamas e vicuñas de brincos cor-de-rosa, montanhas de cores inesperadas e um sem número de saltos inusitados dentro do jipe que chegamos a Uyuni. À nossa chegada, a visão de uma cidade que parece de filme. Um vento louco que levanta o pó branco do chão e cobre a cidade de areia que, à primeira paragem, nos deixa uma camada meia branca no cabelo e irrita os olhos. De fugida, fotografamos o cemitério dos comboios, a cinco minutos da rua principal da cidade. Há carruagens enferrujadas pelo tempo e pela falta de cuidado, num ferro-velho improvisado que virou atração turística. É fim da tarde mas o movimento continua. Reservados os bilhetes para o dia seguinte, vemos o pôr do sol do vidro do carro e tentamos registá-lo com tanta concentração como a que usamos para equilibrar as garrafas de água e os telemóveis nas mãos, enquanto o Pedro insiste em ser racer na estrada de terra batida. À chegada à casa onde vamos ficar, o antigo museu de sal parece abandonado. Não há água quente e, como essa água nos tinha sido prometida, exigimos mudar. Chapa gasta, chapa ganha. Mudamos. Trocas de botijas de gás, descarregar o tejadilho do jipe, um banho quente e uma corrida da casa de banho à casa onde ficamos. Quarto quente, muitos cobertores de lã de lama em cima da cama de colchão de palha e um cenário que mais parece um abrigo de talibãs, como bem referiu a Isabel. E depois, a mesa posta e uma sopa quente para aquecer as cabeças. No dia seguinte, o despertador toca cedo para corrermos para o deserto do sal a tempo do nascer do sol. 




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