quarta-feira, 9 de abril de 2014

Atlântico - Pacífico em dez dias #1


De Buenos Aires a Tupiza


"Where are we now?" A pergunta aparece meia disfarçada entre dois olhos remelosos depois de uma noite mal dormida num autocarro de temperaturas tropicais. Chegámos a La Quiaca, fronteira norte da argentina que liga o país à Bolívia, às sete da manhã, vindas de Salta, La Linda. De Buenos Aires a Salta demorámos uma larga noite de 20 horas, entre bebidas e comidas quentes servidas tipo avião. Viríamos a descobrir depois, os autocarros argentinos são os melhores (e também os mais caros) para viajar na América no Sul.  Do terminal de Salta dá para ir a caminhar até ao centro da cidade. Uma muda de roupa na mochila mais pequena e procuramos um hostel barato só para tomar um banho e refrescar o corpo para mais uma viagem de uma noite. 
Chegar a La Quiaca é perceber uma realidade diferente. No edifício do terminal, uma casa improvisada com um corredor comprido onde gente dorme encostada à parede e embrulhada a sacos-cama e cobertores, está um frio de rachar antes de o dia nascer. Chegamos para o nascer do sol: em La Quiaca, termina o serviço do autocarro. Há que sair, pegar nas mochilas e andar uns 15 minutos a pé até à fronteira com Villazon, a cidade equivalente mas do lado da Bolívia. Na fronteira, uma fila que só os bolivianos passam à frente. Mulheres de panos coloridos às costas começam a passar do imaginário que vinha na cabeça à realidade mesmo à nossa frente. 
Do lado de lá, já com os passaportes carimbados por 60 dias, procuramos transporte para Tupiza, cidade intermédia entre a fronteira e Uyuni, o nosso próximo destino. Chegamos a acordo com um taxista de Tarija, Hugo, que se mudou para Villazon por amor ainda que continue a achar Tarija a cidade mais bonita da Bolívia. Uma hora e meia depois (menos três horas do que demoraríamos se tivéssemos optado pelo autocarro) deixa-nos na estação de comboios. Esticado de caneta na mão, um homem olha de lado quando nos vê passar o arco da entrada. Sem que tenhamos feito qualquer pergunta, avisa: hoje não há comboios para onde quer que seja. 
Pegamos nas mochilas e procuramos sítio para comer. Os cafés são raros, ainda mais se essa for a bebida que queremos tomar. Depois de voltas pelo centro da cidade, entramos no mercado. E é entre as mulheres de saias coloridas que vendem comida e nunca param de comer que decidimos o próximo trajecto, entre um pastel de queijo dividido por todas d canecas generosamente cheias de café acabado de passar.
No caminho para o terminal de autocarros, encontramos a empresa do Freddie, boliviano que faz excursões de Tupiza para Uyuni. É lá que negociamos o preço e o programa dos próximos dois dias e uma noite. Na hora e meia seguinte confirmei que o mundo é uma ervilha - o Freddie tem uma irmã e o sobrinho a viver em Portugal - e pude perceber que ele será provavelmente o grande empresário e dono de metade de Tupiza: além da agência de excursões, aconselha os cafés no botequim da irmã, do outro lado da estrada, e as compras para os dias de viagem na mercearia da mãe, Helena, mesmo ao lado do escritório. Um verdadeiro negócio vertical. 




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